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Pontos que merecem sua atenção:
Quando o jogo muda, a base precisa estar preparada
Tem muito empresário que olha o extrato, vê que as contas foram pagas, sobrou um dinheiro na conta, talvez até investiu uma parte… e pensa: “está indo bem”. E pode mesmo estar indo. Mas tem uma diferença entre ir bem e estar no controle.
Na rotina, ele corre, resolve pepino, fecha venda, entrega o combinado. O caixa fecha no final do mês, mesmo que apertado. E a vida segue.
Mas esse equilíbrio é frágil. Ele funciona porque é o próprio empresário que segura as pontas. Quando dá um problema no cliente, é ele que conversa. Quando o fornecedor atrasa, é ele que remaneja. Quando a equipe trava, é ele que corre atrás. E isso vai virando parte da rotina.
O problema é quando a rotina muda.
Um mês com menos pedido, um imprevisto de saúde, uma oportunidade que exige fôlego financeiro… e aquela estrutura que parecia firme mostra que estava sendo sustentada no braço. Isso acontece muito com empresas que não estão mal, mas também não estão prontas para dar o próximo passo.
E tem uma diferença enorme entre sobreviver e estar pronto para crescer. A primeira dá conta do hoje. A segunda prepara o terreno para o amanhã.
Como funciona a tributação hoje
Hoje a carga está espalhada em vários tributos diferentes: PIS, Cofins, ISS, ICMS, IPI, entre outros. Cada um com regras próprias, regimes especiais, alíquotas que mudam de estado para estado, de setor para setor.
Isso gera distorções, mas também dá margem para manobras.
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O MEI: criado para simplificar, virou a “porta de entrada” para quem quer pagar pouco imposto.
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A pulverização: empresários que faturam bem acima do limite de R$ 81 mil/ano continuam como MEI, só que usando o CNPJ da esposa, do irmão, do amigo.
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A conta mental: “se eu pagar só a DAS, o resto eu ajeito depois”.
Funciona?
Funciona até certo ponto.
Mas é como dirigir sem seguro: quando acontece o imprevisto, a conta chega de uma vez só.
Como será a nova tributação
Com a CBS e o IBS, a lógica muda. O modelo segue o padrão do IVA (Imposto sobre Valor Agregado), já usado em muitos países.
O que muda na prática:
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Unificação de tributos → menos siglas, menos regimes diferentes, mas também menos “atalhos”.
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Crédito financeiro de verdade → só gera crédito o que foi efetivamente pago. O governo fecha a porta para cascatas e manobras.
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Arrecadação digitalizada → cada operação registrada, cruzada em tempo real.
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Menos espaço para informalidade → se hoje já existe fiscalização eletrônica, com a nova base de dados integrada, as incoerências aparecem muito mais rápido.
Resumindo: o governo terá mais controle sobre cada nota, cada operação e cada cadeia de produção/serviço.
Quem sofre mais
A primeira linha de impacto não é para as grandes, mas para as pequenas e médias que sobrevivem “esticando” as regras.
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O MEI inflado: aquele que já ultrapassa 100 mil/ano e continua como se estivesse dentro do limite, vai ser facilmente identificado.
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A empresa que mistura pessoa física e jurídica: cartão pessoal pagando conta de fornecedor, PIX entrando na conta errada, caixa misturado. Tudo isso ficará mais visível.
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Quem gira muito e lucra pouco: como a carga é sobre consumo e movimentação, não ter margem de segurança será fatal.
Essas empresas vão sentir o peso da arrecadação antes mesmo de perceberem qualquer benefício da simplificação.
Quem pode ter benefícios
Nem tudo é negativo. Empresas que já são organizadas, com fluxo claro, notas emitidas corretamente e custos bem estruturados, podem até sair ganhando.
Por quê?
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Crédito tributário mais eficiente → quem compra e vende dentro da cadeia formal terá créditos melhores.
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Concorrência mais justa → empresas que hoje perdem mercado para concorrentes que sonegam podem competir em pé de igualdade.
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Previsibilidade → menos regimes diferentes significa menos surpresas e mais clareza para planejar preços.
Ou seja: quem já está no jogo limpo, tende a respirar melhor.
A informalidade sob pressão
O ponto crucial é que essa reforma não é apenas para simplificar. É para melhorar a arrecadação.
E isso significa que aquele espaço que hoje existe para “ajeitar” vai diminuir.
Pense num exemplo simples e muito comum: o cliente faz um PIX e, em vez de cair na conta da empresa, ele cai na conta pessoal do dono. É prático, rápido, evita taxa bancária, dá a sensação de que “não tem problema”. Mas esse é justamente o tipo de operação que, no novo modelo, fica em evidência.
Se antes passava despercebido, agora será cruzado automaticamente com notas, declarações e o histórico da empresa. Um PIX errado aqui, outro ali, e logo aparece uma incoerência que acende alerta na Receita.
O mesmo vale para a prática de pulverizar faturamento em vários MEIs ou emitir notas menores do que o valor real. Tudo isso vai ficando mais arriscado porque o sistema estará preparado para identificar movimentos que não fecham.
O empresário que hoje se apoia nesses atalhos vai ter que escolher: ou se adequa, ou corre risco de autuação pesada. E a tendência é que os sistemas de controle identifiquem essas incoerências com cada vez mais rapidez.
Se antes a fiscalização era amostral, agora ela será automatizada e integral.
Por que se adequar é sobrevivência
Muitos veem a adequação como uma questão de “bom senso” ou de “estar dentro da lei”. Mas não é só isso. É sobrevivência empresarial.
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Porque sem base sólida, a empresa trava quando precisa crescer.
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Porque depender de atalhos tributários é como depender de empréstimo no cheque especial: funciona, mas custa caro e pode te quebrar.
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Porque a nova arrecadação não perdoa: cada operação vai ser registrada, cruzada e monitorada.
Se até hoje dava para “empurrar” problemas com a barriga, a partir de 2026 isso será cada vez mais inviável.
O próximo passo
A pergunta que fica é: sua empresa está preparada?
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Você sabe exatamente qual a margem por serviço/produto?
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Seu giro de caixa se sustenta sem apoio do cartão pessoal?
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Seus preços são calculados com base na estrutura de custos real ou apenas no que o mercado pratica?
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Sua forma de pagar imposto está alinhada ao que virá ou depende de atalhos que vão desaparecer?
O faturamento pode até estar crescendo, mas sem base tributária sólida, esse crescimento é só aparente.
Ano que vem, o jogo muda.
E não se trata de parecer saudável, mas de realmente estar preparado para sustentar o próximo passo.
Até mais,